Cosmopolis é um filme sobre rapidez, conversas difíceis em sua maioria ocorrendo em um carro. Suas participações narrativas são obscuras, falta-lhe qualquer coisa como um clímax, e apresenta alguns dos personagens mais sem alma e alienados eu já vi. No entanto com direção convincente do veterano canadense David Cronenberg e suas indicações oportunas sobre nossa maneira de financiar a vida, tornando-o uma sombria, comédia desconstrutiva que vale a pena assistir.
Para este post, eu gostaria de estreitar meu foco para o que eu acho que é o tema principal do filme: o corpo humano. Cronenberg, que dirigiu várias produções carnais como : The Fly, Videodrome, Dead Ringers, e Crash (não, não esse), está obviamente preocupado com a personificação como sujeito. Para ele, o corpo é um lugar de transformação, sofrimento, prazer e horror. Mas os seres humanos não são apenas carne, mas também a psicologia, e, portanto, um lugar onde podemos ver os limites "normativos" entre mente e corpo, por dentro e por fora, e todos os tipos de outras quebras e borrões. Em Cosmopolis, David Cronenberg investiga o que eu chamaria de entidades financeiras, órgãos que são abstraídos, racionalizados e rentabilizados para a inexistência ou irrelevância.
Nós estaremos olhando primeiro para o corpo de nosso protagonista, Eric Packer (perfeitamente encarnado por Robert Pattinson). Um prodígio financeiro no valor de dezenas de bilhões de dólares, ele inicia a trama do filme, estabelecendo a meta de seguir pelas ruas de Nova York em busca de um corte de cabelo. Neste dia, entretanto, o presidente norte-americano também está na cidade, bem como uma multidão de manifestantes anarquistas e uma chamada "ameaça crível" para a vida de Packer. Enquanto isso está acontecendo, ele vai intencionalmente destruindo sua empresa e fortuna pessoal através da especulação cambial ruim. Grande parte do raciocínio relacionado a isso permanece um mistério, embora surja alguma superfície aqui e ali. O filme faz com que enxerguemos grande parte do tédio e falta de arduosidade em seu avanço lento por toda a cidade em uma limusine tecnicamente avançada e muito bem guardada, aparentemente idêntico a todas as outras. Enquanto Packer é capaz de gerenciar todos os aspectos do seu negócio usando o carro dele através das redes e suas diversas interfaces do computador, ele consegue mover-se de um lado a outro da cidade para conseguir o seu corte de cabelo.
No início do filme, Packer também está obcecado com a segurança da rede, que está em contraste com o seu desrespeito alegre e por sua segurança física. Para ele, o mundo dos números, dos padrões harmoniosos e transações financeiras, que é real. O dinheiro, que é apenas uma metáfora abstrata para os nossos desejos, deslocou o real. Com a passagem principal da teoria explicita dele, em uma das cenas mais desconcertantes, deixa claro que a riqueza neste mundo das finanças existe apenas para replicar-se e crescer, refletindo os cânceres que Packer faz questão de evitar com seus exames médicos diários. Vemos um desses exames, um exame de próstata ocorre durante uma conversa entre Packer e outro de seus conselheiros. Mesmo durante o sexo, ele pode pensar em nada mais do que a riqueza ou a minúcia de protegê-la. É por isso que defendo que o seu "corpo", a localização de seus desejos, prazeres (se é que ainda existem), e a dor, não residem em seu corpo físico, mas no reino etéreo, quase gnóstico do investimento. Ele e sua empresa são um só. No início do filme, ele é apenas uma pessoa, separado á parte da corporação, ele é uma "pessoa". Ele é uma entidade legal capaz de possuir e transferir somas.
Ao longo do filme, Packer sofre uma metamorfose do tipo, sair de sua crisálida da moeda e emergir como uma pessoa real novamente. Isto é indicado visualmente em alguns temas em um bom número de maneiras. Suas preocupações sobre sua próstata assimétrica reintroduzem preocupações para a integridade do corpo, uma vez que apresenta uma insegurança que não pode ser contabilizada em seu cálculo limpo e perfeito. A ameaça de envelhecimento paira sobre sua cabeça, e ele brinca que ele costumava ser "mais jovem do que todos os outros", mas agora está enfrentando, de uma pequena forma, o espectro da morte. Sua queda da riqueza em uma aposta selvagem ecoa a história de Ícaro, assunto que e é retificado nas manchas de graffiti que se acumulam em sua limusine, na viagem transitória dos arranha-céus brilhantes aos bairros operários na busca por um corte de cabelo, incluindo uma torta surpresa no rosto lançada por um rebelado assassino. Moedas também são identificadas como ratos em uma conversa inicial divertida, e são um símbolo para a corrupção da riqueza e símbolo do encontro dos anarquistas que tentam rejeitar o sistema, mas acabam por ser uma parte dele.
No final, diante de seu próprio assassinato nas mãos de um ex-funcionário descontente interpretado por Paul Giamatti, ele atira na próopria mão. Nós vemos o sangue correr para baixo, e ele começa a chorar quando alça a dor real. Depois de ter forçosamente se despojado da almofada imaginária da riqueza, ele agora enfrenta o mundo real em toda a sua feiura. Ele é revelado, finalmente, como um verdadeiro ser humano. Apesar de ainda ser inteligente e perspicaz, ele também ganhou uma medida de consciência. Ele vê tudo isso através da falsa e importante "justiça" do personagem de Giamatti, e confronta a morte. Embora ele nunca seja admirável ou simpático, exatamente, ele emerge como um ser humano, na último cena do filme, onde não sabemos se ele foi baleado ou não, essa é a parte importante.
O desempenho de Pattinson e direção de Cronenberg são capazes de nos dizer que apesar de tudo de desprezível que Packer fez, ele não é menos humano do que os manifestantes. Algo admirável sobre Cosmopolis é que, embora seja claramente um filme criticando o excesso sufocante de riqueza e o deslocamento e marginalização dos pobres, ele não deixa o público de fora, com uma moral fácil ou uma solução política arrumada. É por isso que, apesar do diálogo no filme ser abstrato e didático, o filme se encerra e ainda nos sentimos sem solução além da tensão por toda parte. Pode ser óbvio sobre o que se trata, mas é muito mais obtuso sobre o que acha que devemos fazer sobre isso. É um filme que aponta para os destroços fumegantes do capitalismo global consumista, embora se admita que no primeiro mundo temos toda a nossa identidade investida nele.
Fonte | Via | Trad e Adapt : Robsten Legacy
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